Páginas

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Autoajuda

Os sonhos de Mariana estavam despedaçados. Ela mais uma vez tentou, em vão, alcançar seus objetivos, mas fora impedida de continuar. Os obstáculos eram vários. Uma hora era a falta de grana, a outra era falta de tempo. Às vezes lhe faltava vontade somente. O universo não conspirava ao seu favor, ela acreditava. Bastaram alguns encontros mal resolvidos no decorrer da vida para dentro dela implodir uma bomba existencial.

Era ainda bastante jovem e não havia encarado grandes dissabores. Entretanto, já carregava no peito uma mágoa daquelas que só se sente em velhos amargurados. Ela desenvolveu o espetacular poder de desacreditar. Incrédula, impaciente e arrasada ela seguia a rotina qualquer. Queria acreditar ser vítima da depressão. Não era. Sua patologia chamava-se tolice mesmo. 

Mariana não suportava culpar somente a si. Insistia também em atribuir aos outros as causas de seus fracassos. Se tivesse recebido uma educação melhor, se os amigos fossem mais confiáveis e os superiores mais humanos talvez as coisas tivessem sido diferentes. Mas a linha do tempo é impiedosa e não dá trégua para “se” nenhum. Tempo é o único recurso distribuído igualmente entre homens e mulheres. O passado é apenas um retrato, seja ele bom ou ruim.

Para Mariana era confortável lembrar sua história do ponto de vista trágico, ignorando lembranças felizes e todos os benefícios que recebera na infância burlesca. Acreditava mesmo que sua dor era um estilo original de vingança. Aspirava vingar-se de todos que não a apoiaram ou apoiaram poucamente.

Mariana era infeliz, pois acreditara ser incapaz de transformar desejos em realidade. Suas ambições transfiguravam-se em decepções tão rápido quanto um pensamento pode cruzar a imaginação. Na maioria dos casos ela nem arriscava alcançá-las. Desperdiçava oportunidades como se as possuísse em imensos lotes. 

Não fora nada fácil, mas enfim ela admitiu não ter talento algum para caçar sonhos. Sofreu no começo, afinal enganaram-lhe toda a vida com falsos elogios à sua inteligência e beleza. No seu mundo se idolatra gente talentosa, não meros medíocres. Os livros de “autoajuda” na estante reforçavam o imaginário de que qualquer ser humano é dotado de competências inatas e bastava cada um descobrir as suas. Ela julgou mentirosas aquelas páginas e se convenceu de que passara da hora de encarar a realidade.

Mariana começou a querer concretizar objetivos e desistiu dos sonhos. Viver de distantes aspirações esmagava-a por dentro. O objeto de desejo não poderia ser uma alucinação, mas sim um ponto de chegada. Tem que ter fôlego e muita força de vontade para alcançá-lo. Convicta disso, Mariana seguiu em frente, convencida de só ter a perseverança como único dom. Não era tão brilhante como outras e outros a sua volta, mas poderia um dia superar a todos se seguisse de cabeça erguida e mente resoluta. Fez a experiência e agora almeja o topo. Seu maior objetivo é ser feliz.

Nenhum comentário:

Postar um comentário